A amizade sem data

A aproximação foi num encontro de jovens. Ficámos logo amigos.
Nesse tempo, escrevíamos cartas, muitas e extensas. Era assim que todas as semanas íamos sabendo um do outro, apesar da longa distância entre a vida dela e a minha. Partilhávamos as coisas boas e também as preocupações das nossas vidas. Era um tempo, em que a chegada do carteiro era aguardada com entusiasmo.
E mantivemos esta amizade epistolar durante bastante tempo. Não nos encontramos muitas vezes, mas apesar disso a escrita ia alimentando esta amizade.
Uns anos depois reorganizamos as nossas vidas e deixamos as cartas e deixamos de saber um do outro. Construímos as nossas vidas, casamos, tivemos filhos e a memória foi-se apagando.

Há pouco tempo decidi procurá-la. Até foi fácil. A lista telefónica na net. Um primeiro telefonema. Um pouco a custo expliquei quem era e ao que vinha. Não foi fácil refazer a memória. Foi grande a surpresa dela, que naturalmente não esperava tal contacto da minha parte. Eu já estaria na lista dos contactos esquecidos e que tinham sido abatidos ao efectivo.
Encontramo-nos umas semanas depois.
Foi bom o reencontro tanto tempo depois. Revisitamos as nossas vidas, falamos daquilo que nos marcou durante este tempo todo. Falamos dos nossos filhos e daquilo que fizémos ao longo deste tempo.
É engraçado como, apesar de tantos anos de distância, foi possível retomar as conversas no sítio em que paramos da última vez.
Temos continuado as nossas conversas.
É certo que este tão grande tempo de ausência nos privou de muita coisa. A situação com esta amiga é diferente daquilo que aconteceu com outros amigos com quem convivemos estes anos, com quem fomos partilhando as alegrias e as tristezas de cada situação (o nascimento dos filhos, as creches, as escolas, as doenças, as experiências profissionais, as dificuldades da vida familiar, ...). Agora nas nossas novas conversas, vamos recuperando o tempo perdido, contando um pouco da nossa vida passada e actual, as expectativas que temos relativamente aos nossos filhos.

Foi pena ter passado tanto tempo sem nos vermos. Talvez tudo tivesse sido um pouco diferente e a vida de cada um poderia ter sido melhor.
Aprendi que vale a pena procurar quem em tempos conheci e que, pelas circunstâncias da vida, perdi de vista. Vou entretanto tentar encontrar outros amigas(os) que deixei de encontrar. Afinal a amizade não tem que ser datada.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

As gravatas não deveriam ser usadas agora

A Biblioteca da Vila, conto de Miguel Beirão da Veiga

Os nomes das doenças [21]